Durante toda
esta semana tenho ouvido o barulho dum comboio que passa perto da nossa
"Casa de oración", em Tlaquepaque, um bairro periférico de
Guadalajara. Não sabia que era "la bestia", o tristemente famoso
comboio da morte, que atravessa o México do sul ao norte e que constitui para
milhares de pessoas o transporte rumo ao "sonho americano".
Dizem as estatísticas
que um destes comboios pode transportar entre 1.000 e 1.500 migrantes,
naturalmente todos ilegais. Sobem enquanto o comboio está a correr e ficam ou
sentados ou pendurados entre duas carruagens. Em ambos os casos a posição é
muito incómoda, e é por isso que a primeira regra que um viajante clandestino
deve aprender é: "não dormes". Não só porque se pode cair por distração
ou por cansaço, mas também por causa de muitos outros perigos: assassinos,
atacantes, narcotraficantes, grupos armados, estupradores, policiais corruptos,
etc.
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E no
entanto, são milhares as pessoas que apanham diariamente estes comboios da
morte. Porquê fazem isso? Para fugir à pobreza, à opressão, às perseguições nos
seus países de origem. A grande maioria vem de países muito pobres, como
Guatemala, El Salvador, Nicarágua, Honduras e do próprio México. A viagem pode
durar até dois meses. Chegando à fronteira procuram um coyote (passador
profissional) que, pela soma de 5.000 dólares ou até mais, aceita de fazer
transitar a pessoa. Estima-se que anualmente cerca de 1.300 pessoas morrem ou
ficam mutiladas no caminho. Uma vez nos Estados Unidos os perigos não acabam,
porque podem ainda ser sequestrados (10.000 emigrantes centro-americanos em
apenas 5 meses) ou repatriados, se surpreendidos sem documentos (250.000 centro-americanos
reenviados aos países de origem num ano). Para tentar ajudar este “exército” de
migrantes, a caridade cristã tem inventado os “centros de acolhimento” (em
espanhol hogares), onde os migrantes
podem encontrar cama e comida gratuitamente. Mas há também um
grupo de 14 mulheres (las “patronas”), que há 15 anos todos os dias preparam
comida e uma garrafa de água para os que transitam perto da fronteira norte.
Ontem fomos
visitar um destes 69 centros espalhados pelo território nacional, a “Casa del migrante” que se encontra na paróquia
de “Nuestra Senhora del Refugio”, em Tlaquepaque, Guadalajara. É um centro
modesto, que acolhe diariamente cerca de 40 migrantes (com picos de 300 e até mais) e oferece todos os dias
120 refeições aos pobres da paróquia (sobretudo meninos de rua e idosos). O centro vive exclusivamente de providência.
O p. Alberto, pároco e responsável do centro, contou-nos muitas histórias
tristes de pessoas que passaram nesta casa, mas também partilhou connosco a sua
alegria de constatar que toda a paróquia está envolvida e colabora nesta obra
de solidariedade. É a sua maior consolação.
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